sexta-feira, 6 de março de 2015

São Tolos São Tiago. Viana do Castelo a Santiago de Compostela pela Costa e Rota do mar de Arousa e rio Ulla

"Esta rota marítimo-fluvial pela Ria de Arousa e o rio Ulla comemora a chegada à Galiza, por mar, do corpo do apóstolo Santiago O Maior, após do seu martírio em Jerusalém no ano 44. Santiago foi pescador de Galilea, apóstolo de Cristo, evangelizador de Ocidente e proto-mártir do colégio apostólico. Herodes ordenou o seu asassinato no ano 44.

Antigas tradições cristiãs, reformadas por textos medievais, asseguraram que após do martírio, alguns discípulos de Santiago recolheram o seu corpo decapitado e que o trasladaram através de todo o mediterrâneo e da costa atlântica ibérica até Iria Flavia, nas proximidades da actual vila de Padrón. A travessia fizeram-a na célebre 'barca de pedra', que quizáis seria uma das naves preparadas para o transporte de minerais que ligavam à Galiza com outras zonas do Império Romano. Na igreja de Santiago de Padrón conserva-se o Pedrón. A tradição conta que nessa pedra se amarrou a barca do Apóstolo após da longa viagem.
Os dois discípulos que acompanharam o corpo de Santiago ate a Galiza, Teodoro e Atanasio, tiveram de andar listos para se enfrontar com a tenacidade da rainha Lupa e a fúria dos romanos acantoados na cidade de Dugium (Perto de Fisterra). Com o carro de bois que portava o corpo do Apóstolo, vencidos os perigos, seguiram o seu caminho até soterrar os seus restos no monte Libredón."


In: http://camino.xacobeo.es/


A possibilidade de se fazer o Caminho em Dezembro foi discutida em Setembro. 

É como diz o ditado (que inventei agora): "Caminho falado em Setembro, é feito em Dezembro".

O dia 1 de Dezembro já lá foi pró Passos, logo restava o 8. Fim de semana com feriado na 2ª feira? Butes.

Depois de alguma pesquisa e orçamentos conseguidos o Caminho de Chaves (entrando no Caminho do Sudeste-Via da Prata) ficou para segundo plano (money issues).

Contudo, o Vasco já tinha visto umas setas novas em Pontevedra...a Variante Espiritual!

Não nos restavam dúvidas. Ia ser Viana-Santiago, adoptando a variante espiritual.

Mapas trabalhados para o GPS, horários marcados, transportes assegurados, elementos participantes confirmados. Muito trabalhinho para que não falte nada aos nossos meninos...


Dia 6/12

06h20

O Leandro lá apareceu, desta vez só com um atraso de 10 a 15 minutos.
Carregam-se as trouxas do Tiago e as minhas para a carrinha. Seguimos para a casa do Costinha. Carrega-se as trouxas do Costinha e siga para Darque.


07h15

Chegada a Darque. Já lá estavam os restantes elementos à espera: André, Vasco e Henrique. Descarregar material e bicicletas, montar equipamentos. 



07h40 - Ainda no mesmo sítio. Café?

Café? Só às 08h00, dizia a mulher lá dentro do tasco, colocando as travessas de bolos nas prateleiras, não se lembrando que cá fora estava frio. Chiça, custava muito servir-nos uns cafés antes das 08h00 em ponto...ainda resmunguei qualquer coisa mas nada adiantava.

08h00 - Café! Finalmente. Com uma nata e sem gorjeta. Prá próxima trocámos badal&%cas. Vão vocês lá para fora e eu vou pôr bolinhos nas prateleiras!




08h15 - Partida!!!!

O vento na velha ponte fazia duplicar o frio. A boa disposição, apesar de tudo, estava lá. 



Fomos seguindo as setas, conhecidas nesta fase e, sem muita história, passámos Âncora, Caminha e chegámos a Vila Nova de Cerveira (o ferry de Caminha está parado). VNC estava invadida de gente, dia feira! 

Fotos do caminho:















(reporte matinal...)




Mais um café, mais setas e alcançávamos o lado espanhol. Agora na margem direita do Minho, sempre junto a este, passámos a Fortaleza de Goyan, O Rosário, cruzámos o Tamuxe, A Cruz e La Guardia (campo de futebol). Com a "nossa amiga" Santa Tecla, sempre a olhar para nós de soslaio desde Âncora, estava agora, finalmente, ali à nossa frente. Comemos mesmo ali na estrada qualquer coisa e fizémo-nos de novo ao caminho. Durante os próximos 3.5Km a coisa ia ser engraçada.





Cada um a seu ritmo, o André em modo descanso, lá atacámos Santa Tecla. E, a verdade, é que rapidamente estávamos lá no alto, nos 312m. E, a esta cota, ao lado do mar e da foz do  Minho, a paisagem é fabulosa. E com o solinho que estava...maravilha.

Pausa para as fotos da praxe, apreciar a vista e preparar para descer, para ver se almoçávamos em La Guardia. 











Lá descobrimos a Pizzería Marbella e por ali almoçámos.


(Reports...)


De La Guardia a As Mariñas o percurso é sempre feito junto à costa atlântica, passando por algumas locais de referência, tais como o Mosteiro de Sta. Maria de Oia [mosteiro medieval pertencente à ordem de Cister e de longa história (1137 a 1835), na qual foi a comunidade monástica de maior importância socioeconômica da diocese de Tui].


















Passando também por Peda Rubia e A Ermida, até chegar a As Mariñas, onde o caminho inflecte para o monte, numa subida técnica que a falta de treino tornou mais dificil para alguns...cof cof cof.






A vista sobre o cabo Silleiro é magnífica e sob um entardecer com bom tempo ainda melhor fica! Subidos os 110m do monte descemos para Baredo, com a foz da ria de Vigo sempre à nossa esquerda. E num instantinho chegámos a Baiona.

A noite fazia-se anunciar e, por via das dúvidas, acrescendo às dúvidas do penisga do posto de turismo (oficina municipal de turismo) quanto a albuergues, resolvemos dormir por ali, numa residencial barata. 

Três ou quatro consulta e a decisão estava tomada: Hotel Pinzón.

Contas do dia: 100.60 Km, feitos em 06h54 em movimento e 1h56 parados. Subida acumulada de 1279m. Velocidade máxima não passou dos 51.60 Km/h.

Viaturas para a lavandaria (mas não para lavar...), quartos distribuídos, banho tomado. Lá fora começava a ficar frio pelo que o melhor era começar a aquecer ainda dentro do hotel, no bar...

Cerveja e, para os dependentes, telemóveis para a frente e para trás! São fraquinhos? São Tiago.

(Os gajos das Reuters são uns meninos à beira disto...)

(E eu ainda não tinha bebido!)

(Enquanto seguiam os telexs prá Reuters nós fomos lá para fora, ver a paisagem)

Uns a beber e outros a explicar o dia, em detalhe! ao télélé... resulta em que os que estão a beber ouvem a conversa dos que estão a falar...e ouve-se, a dada altura, o homem que entrega latas de tinta de ginga a dizer:

"Isto não é normal, estou cansado."

Ah fod%-#$!!! Vai buscar. Isto não é normal...tá certo.

Prós cansados e prós menos cansados - os que foram nesta viagem com os velhos para "descansar" um bocado - a fome fazia-se sentir. Vai daí o jantar rústico na Calle Ventura Misa vinha a calhar. O nome do tasco não sei nem interessa, pelas razões que se seguem.

Depois de muito pão, uma garrafa de vinho do bom (fod#$-se, se aquilo é bom vou ali e já venho) e de esperar 1h pelas 3.5 doses (que dava e sobrava para todos, dizia o gajo), o grelhado misto que nos puseram na mesa não passava de costeleta grelhada mal amanhada, que dava, à vontade para 4 dos 6 que éramos. E batatas para 5. Mau, muito mau. O vinho passou para cerveja, não viesse outra garrafa de vinho "bom". Café não havia mas, em compensação havia licor de café (tem tudo a ver mas pronto). 

Lá vem o home com a garrafa de licor e deixa-a na mesa, com uma recomendação: Cuidado. És fuerte!

Ok. Se é forte bebesse com cuidado. Chopito para aqui, vai lá fora fumar, vem, conversa etc.

Estava na hora de nos pormos ao caminho, vai daí pede-se a conta. O gajo lá vem com a conta (era 8.5, acho eu, o menu). Dinheiro na mesa e o home, coitado, simpático, dirige-se para a garrafa de chopito e pergunta "Tava bom?" Mas, mal percebeu que a garrafa estava seca, murmurou um espantado "Oh!Oh!). Aprende galego! Se não comemos bem, se esperámos muito e se não ficámos satisfeitos, vais pagar com alguma coisa!!!!

Fica lá com o Oh Oh que nós vamos prás canhas! E fomos, os que aguentavam. O André, não é de grandes farras no álcool (e compreende-se), o Henrique estava cansado. Bayona também não estava lá muito animada, o 2º dia prometia coça, vai daí em pouco tempo estávamos a dormir.




Dia 7/12

Acordar cedo, fazer trouxas, pagar hotel, tomar pequeno almoço e zarpar. Tudo correu bem, a manhã (ainda meio de noite) estava fria. E quase tudo correspondeu à verdade, salvo o pequeno almoço...

"Há uma padaria ali depois da rotunda, viras à esquerda, andas até à 2ª rotunda, ...". O caminho estava dado ao André por um gajo que andava a distribuir o pão.

Chiça...tanta pastelaria sem pão, tanto supermercado fechado. E o raio da padaria ou pastelaria não aparecia. Mas, já no ponto em que a coisa funciona por "vamos aquele e acabou" a padaria/pastelaria apareceu! Em Santa Cristina de Ramallosa!!  Yajoma ou lá como se chamava, valia a pena pelos doces! Um dos pasteleiros, contudo, mexia muito as mãos...adiante.

Barriga cheia, o português (era da Feira, não era povo?) que ia lá jogar futebol todos os sábados (maluco!) já tinha partido, o cão que o Tiago tinha visto a mijar na roda do Leandro afinal tinha mijado na dele, bota pró caminho que isto hoje vai doer.

A manhã passou tranquila, o caminho leva-nos por Nigrán, Oya, Vigo. Sempre nas encostas da ria de Vigo, num sobe e desce sempre acompanhado belas pelas paisagens desta ria. Ultrapassada Redondela (pausa para o café/lanche) continuámos em direcção a Pontevedra, aqui já no nosso conhecido caminho português.
























Em Pontevedra, com cerca de 40 Km feitos e debaixo de uma chuvinha irritante, decidimos tachar. Apareceu um tal "A Filloa", com menu mais ou menos atrativo e preço aceitável. 







Bute...roupa a secar, quentinho lá dentro e comida na mesa. E muita...o raio do frango era uma galinhola inteira para cada um!!! O momento foi devidamente registado aqui: https://www.facebook.com/photo.php?fbid=10201956559395802&set=a.3977324171731.1073741826.1839425627&type=1&theater

Cheios de força (ou de peso na barriga) partimos para dar coça ao caminho. Muitos Kms para fazer, viesse quem viesse, tarde longa à frente. Passados 3 Km após Pontevedra, em Pontecabras, finalmente o desvio para o caminho que tanto desejávamos: de Pontevedra a Vilanova de Arousa. Esta variante sim, uma novidade para todos nós (inaugurada em 2013).





Até ao mosteiro de Poio o caminho é curto e vai alternando entre pequenas aldeias e floresta. Nada de especial. Mas o mosteiro de San Xoan de Poio merece ser admirado (vai daí uma rápida paragem).










Descemos de Poio até à ria. Meus amigos...que tranquilidade de espírito. E a culpa é do conjunto Ria de Pontevedra/ilha de Tambo. 

No Parque da Memória







Se não soubéssemos que íamos ter que subir dos 5 aos 425m até que não se estava mal...













Por isso toca a arrancar, com a André, em segredo, a preparar a garganta.

Sobe sobe sobe: Tá boa!

Sobe sobe sobe: Tá boa!

Sobe sobe sobe: "Tá booaaa!"

Entrámos no monte. Tá boa, tá boa ao longe, tá boa...

O Tiago até espumava quando ouvia o eco :)

"Fod&-se, caral$%=". 

Lá chegámos aos 425. Estava feito o pior. Em 8 Km apenas, desde Poio. Sobe bem, mas isso é o que tem piada. Chegámos a ver placas a avisar que a inclinação era de 25% (graças a deus não era para nós) e a descer chegámos aos 33%...

Mas já lá vamos. Desfazer o que tinha sido feito, ou seja, dos 425 para os 5.

E aqui por muito que se tente não dá para descrever. Após o "alto" entrámos num estradão. Velocidade elevada, tempo a recuperar e siga...até que, de repente, uma guinada à direita (após passagem por caçadores de javalis com armas apontadas a nós) e entras num single-track fora de série. Dos melhores que já tive oportunidade de andar.Rápido, sinuoso, sempre a fundo e adrenalina ao máximo. Fora de série dentro dos fora de série. Ficas com pena de saber que aquele single ter um fim, antecipando o fim de um momento inesquecível.

Pensando nisto, do nada, out of the blue, aparece isto:





Mosteiro de Armenteria.

Lindo lindo lindo. O mosteiro tem uma zona de envolvência muitíssimo agradável.













Curioso foi o pormenor de, quando questionada sobre qual a distância a Vilanova de Arousa (e se subia ou descia) uma freira do mosteiro ter dito que não sabia porque nunca tinha saído do mosteiro, tal como as outras. Xiça...o único contacto desta freira (e não das outras) com o público era só mesmo ali, na loja onde vendem os produtos feitos por elas (sabonetes, doces, compotas, etc).

Para saberem mais, se quiserem (tem alojamento):

http://www.monasteriodearmenteira.es/

No café junto à entrada do mosteiro ficámos a saber que só tínhamos que continuar a seguir a rota da água e da pedra, quase sempre a descer, e 20Km à frente encontraríamos VN Arousa. 20Km

Já agora...quanto à rota da água e da pedra:


"La ruta discurre por los márgenes del río Armenteira en su paso por los ayuntamientos de Ribadumia y Meis de la comarca de O Salnés y su trazado permite disfrutar del entorno natural y conocer diferentes molinos de agua, fuentes y lavaderos en distintos estados de conservación."


Ponderámos os prós e contras e arriscámos. Vamos para VN Arousa. E, nesta rota, continuámos num percurso fabuloso!! Estradão em saibro, moinhos aos pontapés, pontes...sempre em grande velocidade (plano/descida ligeira). Muito muito bom.

Era de noite quando chegámos ao albergue de Arousa. Ou ao sítio onde ele ficava...mas nem sinal de albergue. Vai daí fomos à polícia. Si si si, havia um albergue que estava fechado (que queiras em dezembro?).

Ooopsss...

Falámos aos gajos no T4 e eles ligaram logo par ao men que tinha a chave do albergue!!!! ah ah ah ah 

Eles chamaram o responsável pelo albergue que nem estava a acreditar no que ouvia. Num domingo à noite uns gajos para dormir no albergue???

Lá fomos para o albergue que ficava ao lado da protecção civil (rua O Peirán, já agora, para quem precisar).

O home ainda demorou a vir, devia estar a jantar, mas lá apareceu...e ficou espantado com a nossa maluquice: fazer o caminho espiritual de bicicleta e, pior do que isso, em dezembro!!. E a verdade é que ele tinha alguma razão até porque eu já estava a ficar com os pés frios.

Conclusão: um albergue novo só para nós. Há males que vem por bem.



O caloiro ficou assustado quando lhe dissemos que não havia água quente porque o cilindro estava desligado. 

Bem, nada a criticar, o homem foi simpático qb. Deu-nos as instruções que precisava, cobrou e deu-nos a chave. Explicou também que de bicicleta não podíamos apanhar o barco até Padron...

Arrumar sacos e banho!!!!! Quente, menos para o caloiro que pensava que nós íamos tomar banho mesmo com água gelada :)

Acho que exagerei no tempo do banho mas estava-se tão bem... 

Banho, internet, top. Mas vamos é jantar porque foram 106.5Km, 1650m de subida e 07h20min a pedalar (3h46 parados, porque pequeno-almoço contou no bicho garmin).

Descobrimos um tasco catita, cheio de gente, vamos lá jantar. 

E, de seguida, retiro que amanhã há mais (e não havia tascos de jeito, diga-se). Mas, pelo caminho...



















 Dia 8/12

Bela noite de repouso, madrugar, pequeno-almoço remediado.

Siga! De VN Arousa a Padron vais-se sempre junto à margem da ria de Arousa e entra-se no rio Ulla. Mais uma vez com belas paisagens e, para não variar, chuva no lombo! 

Ilhas na ria, juncais, passadiços de madeira e as Torres do Oeste (Catoira).

"As Torres do Oeste localizam-se no concelho de Catoira, comarca de Caldas de Reis, província de Pontevedra, na comunidade autônoma da Galiza, na Espanha.
Erguidas na confluência do rio Ulla com a ria de Arousa, trata-se de um sítio arqueológico composto pelas ruínas consolidadas de torres de origem romana, que posteriormente se constituíram em peças-chave para a defesa dos domínios da arquidiocese de Santiago de Compostela contra os ataques dos Normandos na Alta e na Baixa Idade Média."

Lá fomos seguindo, debaixo de alguma chuvita molha tolos, até chegarmos a Padrón. E de Padrón a Santiago já era caminho conhecido, salvo para o caloiro.

Chegados a Santiago, seriam umas 14h00,  fomos às fotos da praxe, descanso junto à Catedral. Como já disse no relato de outra aventura é engraçado observar os peregrinos que chegam e partem à praça Obradoiro.

Foram 63Km (aproximado, perdi os dados do conta-voltinhas e do GPS...mas pelas contas é o que dá).



 















Posto isto, feita a guerra, o almoço da praxe no sítio da praxe, que não se revela porque só se mostra a quem pedalar ao nosso lado.

Grande almoço, convívio com os amigos que nos foram buscar, e, vários xiripiti depois o merecido regresso. Bons momentos, a juntar no arquivo dos dois dias e meio anteriores. 

Valeu cambada, grande voltinha. Já ia de novo.

Nota, baseada na experiência e para as próximas: o regresso é e sempre será um momento emocionalmente atribulado. Uns estão cheios de pressa para vir para casa, outros só lá foram buscar alguém e também estão a sofrer o frete, outros xiripiti acelerados...dá confusão (apenas e só se não reinar o bom senso). Há que lembrar que quantos mais somos mais confusões pode haver e, principalmente, nestas coisas de gingas, como é sabido, o melhor é reservar o dia para a romaria, ter espírito de grupo e levar a coisa na desportiva.